quinta-feira, setembro 13, 2007

Projeto Orla de Belém apressa o passo. O Liberal 13 set 2007.

Projeto Orla de Belém apressa o passo

Nagib Charone Filho *

Faltando quase um ano para a eleição, a Prefeitura de Belém apressa o passo e apresenta o trabalho da atual equipe, que já faz dois anos e meio ocupa o palácio Antonio Lemos. Até esse tempo, o comandante da cidade tem se esquivado às propagandas e debates, levando a administração dos seus projetos na calada dos gabinetes. Tendo ganhado pontos positivos com o término de alguns projetos de médio porte, como a Duque de Caxias, a equipe trabalha freneticamente no seu mais famoso projeto, denominado Orla de Belém.

Para um observador desavisado, passando pelo rio Guamá, a obra se parece com um simples enrocamento de pedras, desses que muito se viu em Fortaleza para salvar a praia de Iracema. Entretanto, apesar da aparência, a obra é, sem sombra de dúvida, grandiosa para Belém, essa capital miúda onde o Poder Público só se tem preocupado, até agora, com obras para a classe média deleitar-se no ar-condicionado, comendo e bebendo pato no tucupi, olhando ao longe a população destilar suor na canícula do sol abrasador de setembro.

A aparência está muito longe das obras do Sul maravilha, onde tudo é acima de bilhão e as máquinas são de meter medo. O projeto está sendo tocado com uma velha draga sobre a banquisa de areia que se encontra em frente à área da Cata, e com tão pouca importância que nem sinalização náutica possui. Umas poucas bóias feitas de tambores de plástico poitadas ao fundo com blocos de cimento requerem do navegador atenção redobrada para não dar de encontro com o tubo mangote. É compreensível a pequenez das máquinas, pois, ao que se sabe, a obra está sendo tocada com parcos recursos. Mas haverá espanto se algum acidente por lá acontecer, decorrente do choque de embarcações com algum trambolho do trabalho.

O correr da obra começa o enlace de muitas construções horrendas, de arquitetura disforme e com aspecto de construção anterior à idade da pedra. São palafitas desmilingüidas, desengonçadas e desequilibradas, mantendo-se em pé desobedecendo às leis de Newton, porque outra força maior lhe dá sustém: a mão de Deus. As palafitas desequilibradas serão beneficiadas porque o aterro hidráulico haverá de fluir por baixo de toda aquela área, ocupando os espaços entre o piso das palafitas e a superfície das marés, eliminando a água estagnada e cheia de lixo plástico, junto com o lixo orgânico pútrido boiando à superfície da água, em uma posição em que quase não há corrente para de retirá-la.

O andamento da obra, que no dizer da equipe já se encontra com 600 metros, demonstra que a obra é perfeitamente exeqüível, pois que, até agora, não apareceram as interrupções causadas por decisões judiciais nem tampouco as tais indenizações. Todos os ocupantes da beira do rio ainda estão nos seus devidos lugares, e a obra não tocou em nenhum momento em qualquer propriedade porque passa dentro do rio, deixando todas as construções da orla literalmente no seco.

Por essa razão é que, se imagina, não haverá questionamentos judiciais por remoção de propriedade ou mesmo desapropriações com preços inadequados. Porém, é possível que algumas indústrias e pequenos comércios de materiais básicos, como tijolos e madeiras, principalmente, possam a vir questionar o direito de uso do rio como via navegável e meio de transporte para seu comércio. Mas o que dirá a população sobre o direito de ver e usar o rio Guamá como sua propriedade? Que dirão todos os nossos estudantes que passam a vida toda e não sabem como a cidade é banhada por tantas águas?
Eu conheço profissionais bem formados que, se colocados no Guamá, não saberão onde se encontram. Não é para menos, pois, nunca olharam aquela massa líquida contornando a cidade.
Muitos poderão questionar a qualidade da obra quando comparada com o muro de arrimo à frente da Estação das Docas. Entretanto, em uma cidade que não merece dos poderes constituídos as verbas para a falta de saneamento básico como água e drenagem, como pensar em beleza?

Estando segura e durável, bastará a visão do lendário rio Guamá.

* Nagib Charone Filho é engenheiro civil e professor da UFPA.