terça-feira, julho 17, 2007

Madame Saatan na Vila da Barca (O LIberal. Magazine)

Banda de rock grava seu clip no cenário em ruínas de uma favela que se transforma aos poucos em área urbanizada

Rafael Guedes
Da Redação

A tarde quente de domingo e o tecnobrega ultranervoso ecoa de um bar às margens da Baía da Guajará quando os primeiros acordes de 'Devorados' formam uma pesada nuvem sonora sobre a Vila da Barca, em Belém. Perto dali, numa balsa oxidada, a banda Madame Saatan toca sobre um playback à exaustão até que as três câmeras distribuídas ao redor do show tenham esgotado as melhores cenas. Os trabalhos para a gravação do segundo clipe do Madame Saatan começaram cedo, ainda ao amanhecer, mas os músicos parecem não sentir isso. Mesmo a vocalista Sammliz, que em sua performance inquieta acabaria torcendo o pé, conduzia o show como em seus melhores momentos no palco, para uma platéia que, assim como ela, conhecia ali algo novo. Em breve, a realidade da Vila da Barca não existirá mais como a conhecemos, dando lugar a um conjunto habitacional para cerca de 2 mil pessoas. Seu cotidiano é cenário de um videoclipe que reúne cerca de 50 profissionais voluntários e envolve perto de 100 figurantes moradores da Vila. Empenhada em três dias de gravação intensa, a equipe se constitui, certamente, em um dos maiores esforços voluntários em prol de um trabalho audiovisual paraense.

Dirigido pela documentarista Priscilla Brasil, diretora de 'Filhas da Chiquita', com direção de fotografia de Gustavo Godinho e direção de produção de Teo Mesquita, o clipe mergulha na atmosfera da Vila retratando a brincadeira das pipas que tomam conta do céu de Belém no mês de julho. Ao contar as etapas de produção das pipas, explica a diretora, o clipe registra também o cotidiano de uma comunidade que vive sobre as águas numa área tão próxima do centro de Belém. 'A gente queria fazer uma coisa que tivesse a ver com Belém. Achei que a Vila da Barca serviria muito pra isso. Essa realidade não existe tanto em outras partes do País', observa.

Priscilla teve carta branca da banda para escolher o tema e quis fugir da estética dark de que tradicionalmente se alimentou o heavy metal no videoclipe. 'Eu queria fazer um clipe muito colorido, e a Vila da Barca tem isso. Não queria um clipe dark, típico de metal - na verdade eu vi poucos clipes de metal coloridos. Como estamos em julho, mês de férias, quando chegamos, o lugar estava infestado de pipas. Ela está em todos os lugares, e a gente resolveu adotar isso como a linha central do vídeo', conta Priscilla. 'Os meninos fazem a pipa, depois saem empinando pela Vila da Barca - e a gente consugue ter um panorama legal do lugar, das pessoas, da condição da Vila - e terminamos com a banda. Fora isso, tem a questão de que a Vila da Barca está desaparecendo. Eles passam pelos barracos que estão sendo destruídos.' O clipe ainda não tem data de conclusão prevista.